Nigel Amon - Cubisme Africain

Nigel Amon   -   Cubisme Africain

6 de jun. de 2012

WWW.sobrejornal.blogs

[trecho]  Reducionismos

Dentre todos os clichês e lugares-comuns que é possível ouvir atualmente, nenhum me irrita mais do que a afirmação de que “hoje em dia os valores não são mais respeitados”. Essa expressão está presente em todos os espaços cotidianos. Das conversas de ônibus aos textos acadêmicos. Ela permeia o imaginário brasileiro de que, em épocas passadas, havia um certo nível moral mais elevado. Nada poderia ser mais estúpido.
Eu gostaria de perguntar aos propagadores desse infeliz aforismo: Quando os tais valores foram respeitados? Aliás, a noção de valor, por si só, é arbitrária e extremamente subjetiva. Mas, enfim, admitindo-se que exista um conjunto de doutrinas morais e éticas que supostamente regem uma sociedade, quando eles foram respeitados em escala infinitamente maior? No Brasil-colônia, quando houve um genocídio das culturas nativas, a total exploração das riquezas nacionais e os governadores-gerais cometiam toda sorte de extravagâncias? No Brasil imperial, com a discriminação aos negros recém “libertados” por uma lei que sequer lhes assegurava um mínimo de dignidade? Nas primeiras décadas do século XX, quando a intensa urbanização sofrida pelas metrópoles brasileiras, especialmente o Rio de Janeiro, enxotou os pobres para os morros e tentou transformar, pelo garrote, a Capital da República numa espécie de Paris tupiniquim? Nos anos 1950, época em que Juscelino desestimulou a indústria nacional, arregaçou o país às multinacionais e os brasileiros deram vivas aos enlatados norte-americanos? Não vou nem comentar o período 1960-1980. Décadas em que “lei” e “ordem” tinham significados muito mais obscuros e cruéis. Passamos, então, aos anos 1990. Me pergunto quais valores podem ser extraídos da privatização de uma nação, de homéricos índices inflacionários e de um governo tão podre que consegue se auto-reeleger...

Nenhum comentário: