Correligionários do
deputado não acreditam que Conselho de Ética deva cassar seu mandato
O temido efeito colateral do impeachment da presidenta Dilma no
Congresso já está em curso. O deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que
agiu como o maior antagonista ao Governo, ganhou ares de vitorioso neste
domingo. E agora sua bancada informal quer retribuir o serviço prestado. O
peemedebista é réu no Supremo Tribunal Federal por seu envolvimento na Lava
Jato, e está sob o risco de perder seu mandato no Conselho de Ética por ter
mentido na Comissão Parlamentar de Inquérito da Petrobras, onde ele negou ter
contas no exterior. Se isso acontecer, ele perderia o direito ao foro
privilegiado, e poderá ser julgado pelo implacável juiz federal Sérgio Moro.
Entre seus correligionários, porém, já existe uma movimentação para
que ele não perca o mandato. “O juízo da casa é um juízo político, de
conveniência e oportunidade”, afirma o deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), para
quem o processo no Conselho “não vai dar em nada, uma vez que o Cunha tem
maioria lá”. De qualquer forma, o paranaense considera a cassação do mandato
uma punição muito severa. Ele cita uma suposta decisão do Supremo segundo a
qual “mesmo sob juramento você pode mentir para não se prejudicar”. “Logo é
duvidoso ele ser condenado por mentir sem estar sob juramento”, diz Serraglio,
que acredita ainda que o presidente da Casa tenha conquistado a simpatia de
muitos parlamentares pela agilidade com que fez o processo de impeachment
tramitar.
O primeiro passo para livrar Cunha no Conselho – cujo processo se
arrasta a um ritmo lentíssimo – foi a troca do deputado Fausto Pinato (PP-SP),
no início de abril. O pepista foi um dos 11 membros do colegiado que votou pela
continuação do processo de cassação, contra dez que sugeriam a interrupção do
processo. Sua vaga foi ocupada pela deputada Tia Eron (PRB-BA), que integra a
bancada evangélica e é alinhada com o presidente, o que aponta para uma
inversão de resultado favorável a Cunha.
O deputado Carlos Marum (PMDB-MS), aliado do deputado, é outro que
acredita que a cassação do presidente da Casa por ter omitido as contas no
exterior é uma punição exagerada. “Entendo que deva haver [uma punição], mas
não entendo que deva ser a cassação”, afirmou. Já Paulinho da Força (SDD-SP),
um dos maiores defensores de Cunha, foi mais explícito. Questionado se o
presidente conquistou a simpatia de alguns colegas por ter agilizado o processo
de impedimento de Dilma, o sindicalista respondeu que “ele ganhou força, graças
a ele o impeachment passou”.
Para o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ), a operação abafa para
salvar o mandato do presidente da Casa já era prevista. “Está se confirmando o
que nós já sabíamos, é uma grande farsa, eu não ficaria nem um pouco surpreso
se ele fosse anistiado pelo Conselho de Ética ”, afirmou o parlamentar. Segundo
ele, Cunha “está empoderado nesse momento, foi o grande vencedor do processo de
impeachment, e aí tem o corporativismo parlamentar, que tentará protegê-lo”.
Alencar afirma que a grande esperança “para a democracia e para a Câmara” é que
o Supremo aja com rapidez e condene ou afasta o peemedebista.
"Não adianta querer limparmos a casa do vizinho e não
limparmos a nossa", criticou o deputado Júlio Delgado (PSB-MG). Um dos
opositores de Cunha na Casa, Delgado diz que vai cobrar que os movimentos
pró-impeachment pressionem a Câmara a derrubar o peemedebista também.
De acordo com o site Congresso em Foco, porém, a defesa de Cunha no
Conselho irá usar como estratégia para desqualificar a acusação do falso
testemunho um argumento técnico. O dinheiro depositado nas contas suíças não
seria de fato dele, mas sim resultado de negócios como exportação de carne.
Neste caso, ele seria apenas beneficiário do dinheiro administrado por um
truste criado para gerir os recursos. Se for considerada a ovação ouvida pelo
presidente da Casa ao proferir seu voto favorável ao impeachment neste domingo,
a estratégia deve funcionar. Nos últimos meses, com o apoio dos líderes de
partidos da oposição, o parlamentar se dedicou a fazer tramitar em tempo
recorde o pedido de afastamento da petista. Neste domingo ele alcançou seu
grande objetivo.
Colaborou Afonso Benites e Rodolfo Borges, de Brasília