Luiz Ribeiro
"Muitas vezes é a falta de caráter que decide uma partida", disse uma vez Nelson RodriguesFico pensando como Nelson ia odiar o futebol atual, cada vez mais vigilante, moralista e em busca da justiça, principalmente nos tempos de VAR. Aliás, odiar o VAR devia ser a única instituição de quem ama futebol.
Uma das coisas que faz o futebol tão fascinante é o fato dele ser muito injusto. De todos os esportes, o futebol é aquele em que é mais possível ser o pior e ainda assim ganhar. Talvez seja isso que faz ele tão popular: ele lembra muito a vida.
A graça do futebol está justamente na capacidade que ele tem de errar. De ser jogado com a falta de caráter, com a malandragem. O futebol pode ser vendido com os piores sentimentos, e isso é mágico.
O juiz, por outro lado, é um só e precisa cobrir aquele campo imenso com dois bandeirinhas só pra ajudar. O vôlei, por exemplo, tem um juiz pra cada linha. O basquete tem uma cúpula. O futebol americano é quase um tribunal do júri a céu aberto.
O desejo de justiça, de correção, não estraga só o futebol. Estraga a história do futebol. Maradona não teria feito a mão de Deus e nenhum golaço histórico impedido ou que a bola nem entrou teria acontecido. As melhores histórias do futebol estão em erros de juízes ou estratégias de jogadores pra enganar a regra.
O VAR é Foucault purinho: acreditar que mais câmera, mais juiz e mais vigilância vão tornar o mundo melhor. Pelo contrário, Nelson já dizia. Vai tornar o futebol moralista, chato, americano, vigilante, Zé regrinha e sem aquela coisa especial chamada injustiça. Roubo mesmo.
Imagina ninguém poder mandar o juiz pra put* que pariu e alegar ter sido roubado mesmo não tendo nenhuma prova? Estar errado e reclamar é uma instituição a ser preservada no futebol. É o único negacionismo incentivável.
Por isso, passou da hora de parar de insistir na ideia do VAR.