
Pietá
Michelangelo esculpiu esta cena ('Piedade') quando
tinha 23 anos. Ao saber que um apreciador recusara-se a acreditar que alguém
tão jovem pudesse esculpir obra de tal magnitude, Michelangelo talhou seu nome
na faixa que atravessa o seio da Virgem. Foi a sua única escultura assinada. O
tema da Mãe com seu Filho morto ao colo é um dos mais dramáticos da iconografia
cristã.
A beleza trágica do grupo deriva de seu
classicismo, onde se somam a angústia do momento com a serenidade da composição
triangular, e especialmente na postura contida da Virgem. Há um clima de
melancolia, de profundo pesar, mas sem o sofrimento que caracterizou inúmeras
outras representações da mesma cena, feitas por outros artistas. Tecnicamente,
o trabalho de talha do mármore é perfeito, o acabamento polido, até que a
superfície branca da pedra parecesse translúcida. Contribuem para a qualidade
da anatomia do corpo de Cristo os inúmeros estudos que Michelangelo realizou
com cadáveres.
Técnica
preferida: a talha em mármore
Embora
pintasse magistralmente, compusesse poemas e projetasse em arquitetura, a
técnica preferida de Michelangelo era a escultura em mármore. Michelangelo
chegou mesmo a declarar que a pintura era uma "arte menor".
Utilizando os tradicionais equipamentos da talha em pedra, cinzéis e pua,
Michelangelo era dono de extraordinária técnica, desde a escolha dos blocos de
pedra até o esmerado polimento final.
A pedra de mármore própria para a escultura
não pode ser extraída da pedreira atavés de explosões. A utilização de
explosivos, tão comum nas pedreiras nos dias de hoje, esfacela o núcleo da
pedra, criando trincas e rachaduras que comprometem a consistência da rocha.
Para ser esculpida, a pedra deve ser cortada no método tradicional, isto é,
inicialmente realizando uma série de furos profundos, em linha reta, sobre a
superfície da qual se pretende destacar o bloco. Depois, com a colocação de
cunhas em cada furo, ir martelando até que o bloco desejado se
destaque da pedra.
A talha
também exige certos cuidados. O trabalho do desbaste deve ser realizado com
batidas nos cinzéis de forma rítmica, isto é, cada batida da marreta no cinzel
deve seguir uma cadência fixa. A razão disso é que cada batida realizada sobre
a rocha cria ondas de reverberação que percorrem toda a pedra. Se as batidas
não forem rítmicas, duas seqüências de reverberações em momentos distintos
podem trincar a pedra internamente.
Também a
planificação da escultura deve ser precisa, pois a pedra não permite retoques.
Uma vez talhada equivocadamente, não é possível realizar colagens ou
remendos. Michelangelo trabalhava a pedra diretamente, "libertando" a
figura de dentro da rocha, como ele mesmo dizia. Algumas de suas esculturas ele
as deixou inacabadas, como alguns Escravos, assim como algumas Pietás.
O objetivo expressivo havia sido alcançado sem a necessidade dos acabamentos
finais.
Finalmente, o
acabamento era uma das mais desgastantes e penosas experiências do ato
criativo. Todo desbaste final, sutil, deveria ser feito com a utilização de
pedras abrasivas, lenta e progressivamente, eliminando toda marca de cinzel que
houvesse ficado. Nos dias de hoje, utilizamo-nos de esmerilhadeiras e
lixadeiras elétricas, o que facilita em muito tais atividades
Davi
Michelangelo esculpiu esta obra quando
tinha apenas 26 anos. O imenso bloco de mármore havia sido encomendado para que
o escultor Duccio ali talhasse a figura de um profeta. Com o falecimento deste
repentinamente, a pedra ficou à espera de outro escultor. Quando Michelangelo
terminou a escultura, um grupo de artistas - entre os quais estavam Leonardo,
Botticelli, Filippino Lippi e Perugino - foi indagar de Michelangelo onde
deveria ficar a estátua. O mestre indicou a praça central de Florença. O povo
da cidade, chocado com a nudez da figura, lapidou a estátua, em nome da moral.
Perfeita, tanto do ponto de vista
técnico quanto anatômico, a obra se transformou num símbolo de Florença. Hoje,
ela foi substituída na praça por uma cópia. Davi olha ao longe como se o
combate com o gigante estivesse prestes a acontecer. A ausência da cabeça de
Golias – algo comum em representações da mesma cena por outros artistas - concorda
com esta interpretação. O rapaz está tenso, mas não angustiado. Seu ar
desafiador mostra a 'ação em suspenso' que era característica das esculturas de
Michelangelo.
Nos olhos pode-se ver uma das provas da
imensa genialidade do mestre. Ele perfurou a região da pupila dos olhos em
forma de (V), como um casco de cavalo, de maneira que quando a luz incide sobre
os olhos transversalmente, ilumina mais a área ressaltada (o V), deixando na
penumbra a região cavada. Isto dá um efeito extremamente realista aos olhos,
que parecem brilhar com o espírito do Rei guerreiro.
Texto de João Werner
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