Nigel Amon - Cubisme Africain

Nigel Amon   -   Cubisme Africain

30 de dez. de 2021

A incansável jornada de Bolsonaro para cooptar as Forças Armadas – e o que esperar disso

O ministro da Defesa, general Fernando Azevedo e Silva, leu a mensagem de WhatsApp na manhã de sábado, 27 de março passado: o presidente Jair Bolsonaro insistia que o comandante do Exército, o general Edson Pujol, fosse demitido imediatamente. O presidente estava irritado com o silêncio do general. Queria que ele tivesse feito um pronunciamento público contra as tentativas dos governadores de decretarem lockdowns para combater o avanço da pandemia. A última vez que um presidente da República pediu a cabeça do comandante do Exército foi em 1977, no governo militar de Ernesto Geisel. O general Azevedo e Silva, que ocupava o cargo de ministro desde o início do governo, leu a mensagem de Bolsonaro em seu celular, mas manteve sua posição: não demitiria Pujol.

Bolsonaro martelou ao longo do fim de semana, enviando diversas outras mensagens ao ministro. Dizia que os lockdowns eram uma violência contra “a liberdade individual” e um atentado à “recuperação econômica”. Queria dar uma demonstração de força e mandar um recado aos governadores de que tinha o apoio dos militares. Mas o general Azevedo tentou explicar que o Exército não poderia e nem dispunha de meios para evitar que os governadores adotassem lockdowns, pois tinham amplo amparo legal para fazê-lo. Nada resolvia o impasse. As mensagens começaram a subir de tom. Com seu perfil conciliador, o general sugeriu que deixassem para conversar pessoalmente, no Palácio do Planalto, na segunda-feira.

A insatisfação de Bolsonaro com Pujol era antiga. No fim de abril do ano passado, durante uma visita ao Centro de Coordenação de Operações de Saúde, do Exército, em Porto Alegre, Bolsonaro estendeu a mão para cumprimentar Pujol, que, em vez de responder com o mesmo gesto, ofereceu-lhe o cotovelo, em respeito às medidas de contenção do vírus. Seria um desencontro banal, como aconteceu a tantas pessoas e tantas vezes na pandemia, mas não para um presidente que sempre fez questão de desprezar as orientações sanitárias. Bolsonaro jamais perdoou o general. O desacerto entre eles só aumentou ao longo dos meses seguintes. Compreendendo a gravidade da pandemia, Pujol se recusava a criticar as medidas de isolamento social em vigor nos estados, o que deixava Bolsonaro ainda mais irritado.

Na tarde de segunda, conforme ficara combinado por WhatsApp, o general Azevedo e Silva entrou no gabinete de Bolsonaro, no terceiro andar do Planalto. Nem foi convidado a sentar-se. “Fernando, quero o seu cargo”, disparou o presidente. O general ficou surpreso, mas não se alterou. “Pois não, presidente, o cargo é seu.” Como compensação ao general, com quem tinha uma amizade antiga, desde a década de 1970 quando cursaram a Academia Militar das Agulhas Negras (Aman), Bolsonaro ofereceu-lhe uma vaga num conselho de alguma estatal no Rio de Janeiro, cidade onde o ex-ministro tem apartamento. Azevedo declinou. O encontro transcorreu em clima frio e, ao final, o general fez um alerta. “Saiba que o senhor não irá colocar as Forças Armadas numa aventura”, disse. “O senhor não vai levar as Forças para a política.”

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