Em nova alucinação, o cronista digital voltou a
entrevistar sua lembrança de Leonel Brizola
– desta vez, no dia da condenação de Lula
em segunda instância.
Entrevista:
Governador, daí onde está agora, o senhor acompanhou o julgamento
do Lula?
Sim, Romeu. Eu, de
cá onde estou, a tudo assisto e tudo ouço. Vi tudo isso com grande apreensão e
tristeza. Francamente, sinto muita tristeza. Este velho coração, já parado,
ficou mais engelhado, tu podes acreditar. Vi tudo isso, principalmente, com a
preocupação de quem não pode mais estar aí para manifestar a sua indignação.
Por isso, mais uma vez, pedi permissão aos líderes do universo, que um dia tu,
que és novilho precoce, também saberás quem são, para acompanhar mais esse
calvário, que não é só do Lula, creias, mas de todo o povo brasileiro. Pedi
permissão também para dizer através de ti, novilho precoce, como tantos que aí
vejo, algumas palavras.
Novilho precoce?
Tu me perdoes. Não
te ofendas, Orfeu. Novilho precoce é aquele abatido quando ainda não completou
30 meses. É como vejo os sonhos da tua geração. A tua geração foi abatida em
tantos sonhos desde que esses facínoras, não é verdade?, se aferraram ao poder
no fim da ditadura. Deu-se, então, a ditadura econômica, comandada por esses
filhotes da ditadura militar. Houve a vitória do povo com Lula, depois com a
dona Dilma, mas, no fundo, tisc, no fundo, eles, os facínoras, estiveram sempre
ali, de prontidão, o tempo todo, comandando os carreiros com suas varas finas,
a guiar a boiada rumo ao abatedouro da ditadura econômica. Francamente,
acredito que o PT, num dado momento, achou que a fatura já estava ganha e deu
rédeas a esta gente. Eu sinto pena de ti e de tantos novilhos precoces abatidos
em seus sonhos. E sinto, sobretudo, creias, uma profunda dó do Brasil.
O julgamento do Lula foi injusto?
Só a maldição do
Coisa Ruim poderia fazer alguém, em sã consciência, acreditar que o que se
passou com o Lula transcorreu de uma maneira limpa e justa. Francamente! Lula,
vá lá, cometeu por aí os seus equívocos. Pecados veniais. Francamente, Lula
costeou o alambrado algumas vezes, e até ultrapassou a cerca em ocasiões
importantes, fazendo festa de cusco interessado num naco de carne, ou mesmo
cegando os olhos para os donos do poder econômico e político, que ameaçavam a
sua governabilidade. Mas, a rigor, não vejo em nada um crime que justifique
esse calvário imposto pelo juiz Louro ao ex-presidente.
O senhor fala do juiz Moro?
Alfeu, perdoes este
velho já morto, que vem de longe, e ainda não se habituou ao nome do
magistrado. Mas, francamente, com todo o respeito aos louros, ele, o juiz, está
mais para Louro, a ave, não é verdade?, aquele que reproduz o que o dono repete
e não pensa nem sabe o que diz. Só reproduz o que lhe ensinam na repetição.
O juiz Moro estaria a serviço de que dono?
Francamente, a
rigor, não vejo de outra forma. Ele, o Mouro, não parece ter a virtude da
isenção, que se presume que os magistrados devam ter. Está claro, nas suas
decisões, a quem ele serve. Veja como ele se comporta com os do lado de lá!
Chega a ser perigoso para o Judiciário ter o destino do Brasil nas mãos desse
jovem juiz, cujo objetivo, a mim me parece, é apenas o de esmagar Lula e suas
possibilidade de retorno à Presidência. E a quem interessa que Lula esteja fora
da disputa?! Não sei quais são as convicções políticas do meritíssimo, o que
ele supõe como país ideal para os seus filhos. Mas se tem tem rabo de jacaré,
dente de jacaré, couro de jacaré, só pode ser jacaré! Vejo essa artilharia
contra o Lula diferente do bombardeio daquele cantor, por exemplo, o Tigrão,
francamente, que ataca, ataca, ataca com sua língua afiada, e nada propõe para
pôr no lugar do que deseja desconstruir. Essa gente a que o juiz Louro serve
sabe muito bem o que quer perpetuar.
Quem é esse Tigrão, governador?
O cantor… Eu não
saberia classificar. Funkeiro talvez não seja. Acho que é do iê-iê-iê, uma
espécie de astro do iê-iê-iê brasileiro, que anda apartado da grande mídia. Ele
tem uma música que admiro, que diz: “A vida passa na TV.” Nem sempre a vida
real passa na TV. Mas este verso desse Tigrão, na verdade, diz um pouco do meu
sentimento.
Governador, não seria Lobão?
Sim, é esse. Peço
perdão a ele pelo meu engano, Aristeu.
Marceu, governador.
Ah, quanto a ti, já
me desculpei muitas vezes. Sempre troquei teu nome. Tu me desculpes, Marcel.
Mas deixe-me concluir. O juiz não é como esse Tigrão, que expõe seu desejo de
demolir tudo isso que aí está sem oferecer uma alternativa capaz de estancar o sangue
do povo brasileiro. Tu sabes que eu também jamais morri de amores pelo Lula. Há
questões fundamentais nas quais divergimos ao longo de toda a minha passagem
por este plano. Mas não vejo no Brasil alternativa melhor neste momento do que
o Lula. O povão humilde, as nossas crianças de pés descalços e canelas ruças,
as mulheres oprimidas, os nossos irmãos negros, quem melhor para olhar por
eles? Penso que esse seja o Lula. Por isso, os interésses econômicos o temem
tanto, porque querem o leite da vaca só para si! Quem melhor para estancar as
perdas internacionais que mantêm tudo isso que aí está?! No meu entendimento,
honestamente, o Lula.
Governador, o presidente Temer disse que…
Um momento, Argeu!
Tu me desculpes interromper. Não quero falar desse Temer. Esse Temer, a rigor,
não é nada! É um rito de passagem, um bonecão do posto, não é verdade?, tu me
entendes, um bonecão do posto que está ali, tisc…, está ali só para cumprir a
tarefa de quem de fato comanda as ações, que é o poder econômico, que é essa elite
apodrecida, que, daqui onde estou eu pressinto, um dia vai morrer de velha sem
que ninguém vá ao seu funeral! A rigor, é o que vai acontecer! A elite
brasileira vai morrer de velha, podre, sem que ninguém vá ao seu funeral!
Voltando ao julgamento, o senhor acreditava na possibilidade de
absolvição do Lula?
Veja, Pirineu. Como
se diz nos pampas, o cenário sempre esteve mais feio do que o diabo chupando
limão, não é verdade? Tudo se deu como o grande poder desejava que as coisas
sucedessem. Mas, honestamente, mantenho a minha fé no bom senso dos juízes que
ainda julgarão novos recursos do ex-presidente. A mim, sempre pareceu
improvável o cenário de 3 a 0 a favor do Lula. Mas acreditava numa análise mais
equilibrada nessa segunda instância do que os 3 a 0 contra ele. Eu me recolho
com grande tristeza depois de assistir ao que assisti em Porto Alegre.
O aumento da pena de Lula, na sua opinião, sinaliza que…
Permita-me concluir.
O tempo é o maior de todos os juízes. O tempo também julgará esses desembargadores,
como também julgará o juiz Louro. Os regentes dessa sustentação ao juiz, a meu
ver, são mais assanhados do que lambari de sanga. São mais ásperos do que
língua de gato. Mas, a rigor, esse julgamento do Lula não passa de uma bazófia
para o juiz Mouro. Na verdade, foi um teatro apenas! Um teatro! A rigor, foi um
teatro, com final já previsto. Lula, para eles, já estava esgualepado que nem
cincha de bagual. Mas lhe asseguro, Doalcei, Lula é forte e resistirá. Disso,
creias, eu não tenho dúvidas. Confio que algo de positivo ainda vai de
acontecer.
No Judiciário?
Se não for pela ação
do Judiciário, será pelo poder das ruas.
O senhor acompanhou o comício do Lula e da Dilma em Porto Alegre na
véspera do julgamento?
Sim. Confesso que
assisti a tudo com muita alegria e saudade daquele cenário. Eu mesmo já estive
ali, diante de multidão até maior, modéstia à parte, proferindo as minhas
crenças e as minhas verdades. No meu último quarto de hora neste ambiente
terreno de vocês, era do que mais sentia falta, de falar co franqueza para o
nosso povão.
O senhor ainda acredita que Lula consiga se candidatar?
Veja, Ateneu. Quando
eu estava no exílio, e aqui ainda mal se falava em abertura política, ninguém
acreditava que o Leonel Brizola pudesse voltar e se eleger governador.
Sobretudo de um estado como o Rio de Janeiro, onde funcionava o intestino da
ditadura, não é verdade? No Rio de Janeiro, estava o intestino grosso da
ditadura! Mas este velho combatente, como tu sabes, desembarcou na Guanabara e
derrotou até mesmo a fraude! E tiveram de nos engolir! De modo que não duvido
das possibilidades do Lula. Uma nuvem escura se precipitou sobre o campo
popular, que é o nosso, que é o do Lula, mas a tempestade, tu creias, tisc…,
não dura para sempre. Nem o dilúvio de Noé durou para sempre. De modo que
mantenho a minha crença.