Ligação de Moro com a Globo prevaleceu e ele quer ser
'vedete do impeachment', diz cientista político
Sputnik News - Segundo
cientista político Carlos Eduardo Martins, a demissão de Sergio Moro deve
afetar de forma profunda a situação política no Brasil.
Na manhã desta sexta-feira
(24) o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, pediu demissão do
cargo após a exoneração do diretor-geral da Polícia Federal, Maurício Valeixo,
ocorrida à sua revelia e sem a sua anuência.
Sergio Moro acusou Jair
Bolsonaro de agir politicamente
na Polícia Federal, deixando em aberto ao
público o seu
próprio futuro, bem como o futuro do governo Jair Bolsonaro.
O cientista político
Carlos Eduardo Martins, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro,
acredita que a demissão de Sergio Moro agrava as fraturas já existentes nas
elites brasileiras em relação ao governo de Jair Bolsonaro. Para ele, a gestão
macroeconômica realizada pelo ministro da economia Paulo Guedes está sendo
"um desastre", acentuado pela pandemia do coronavírus.
"Governo Bolsonaro
joga sobre as costas dos
trabalhadores todo o peso da solução ou
da suposta
solução dessa crise através da
aceitação das iniciativas de abandono da
quarentena e exposição dos trabalhadores
brasileiros à política do
genocídio", disse o
professor para Sputnik Brasil.
O cientista político
ressaltou as tensões entre o Grupo Globo e Bolsonaro desde o início do governo.
Assim, a Globo seria representante do establishment tradicional e o
grupo em torno do governo Bolsonaro seria um grupo emergente, ligado "à
face mais agressiva do imperialismo norte-americano", disputando o
controle sobre o Estado brasileiro. Nesse contexto, Moro seria uma figura
híbrida, "que circula entre essas duas vertentes".
"É
Um
homem
que deve muito
de sua carreira à projeção
recebida do Grupo Globo.
Então
acho que, nesse momento de
desgaste
do governo Bolsonaro,
pesou essa vinculação
de Sergio Moro com o
Grupo Globo, que deve entrar
num confronto de morte
com Bolsonaro em função da
questão da renovação da
sua concessão para funcionar
como grupo midiático
no Brasil".
Segundo Martins, o governo
perde parte de sua base política com a demissão do ex-juiz da Lava Jato, pois
Bolsonaro foi "resultado da culminação do golpe de 2016", que partiu
de atores que antecederam o político.
"O governo perde
parte de sua base de apoio, mas a direita do Brasil se estilhaça entre um grupo
liderado por uma direita tradicional que deu o golpe em 2016 e um grupo
emergente, associado ao governo Bolsonaro", argumenta o acadêmico.
Interferência na Polícia
Federal
Apesar das declarações de
Sergio Moro, feitas na manhã desta sexta-feira, acusando o presidente de
ingerência nos assuntos da polícia,
Carlos
Eduardo Martins
afirmou
que essa prática
também
era praticada pelo
ex-juiz.
Martins citou o deputado
federal Glauber Braga (PSOL-RJ), segundo o qual Moro sempre atuou como instrumento
de interferência de Jair Bolsonaro na Polícia Federal em diversas
situações, como no caso de
bloqueio
de investigações sobre
envolvimento de Flávio Bolsonaro
em esquemas de "rachadinha" em
sua época de deputado estadual no
Rio de Janeiro, bem como na intervenção
em investigações sobre o mandante do
assassinato da vereadora Marielle Franco.
"Há muito tempo
Sergio Moro vem atuando como interventor do governo Bolsonaro na Polícia
Federal. Agora Sergio Moro resolveu recuar e eu creio que esse recuo está
associado às questões que eu mencionei anteriormente".
O acadêmico acredita que
Moro busca ser "a vedete do processo de impeachment" e é o candidato
natural da direita à sucessão presidencial em 2022. Já o governo Bolsonaro,
segundo o especialista, "vai se aproximando do seu final precoce".
O professor acrescentou
que as Forças Armadas provavelmente devem se afastar de Bolsonaro e transferirão
todo seu apoio ao vice-presidente Hamilton Mourão.
"Até porque o
sucessor de Bolsonaro é Mourão. Mourão é um homem de carreira militar muito
mais extensa, louvável, do ponto de vista corporativo e institucional, que a de
Bolsonaro. Então Mourão é um homem que tranquiliza as inquietudes dentro das
Forças Armadas", explicou Martins.
O
cientista político acredita que um processo
de
impeachment de Bolsonaro "vai
sangrar
a direita internamente" e
vais ser um processo
de muito fogo
cruzado
.
"A
esquerda
tem que ter inteligência,
ousadia e iniciativa para tirar
partido
dessa conjuntura e voltar a
influenciar
a opinião pública no Brasil",
concluiu
o entrevistado.