Eu entendo a
indignação das pessoas com o excesso de impunidade no Brasil. Seja
por incapacidade da polícia, por uma falha no sistema judicial, seja
pelas punições brandas para certos crimes. Ou ainda, pelo fato de
que, em alguns recônditos das grandes cidades, sequer existe um
“Estado” que possa assegurar a lei e a ordem.
Este tipo de
indignação gera um sentimento legítimo em muitas pessoas: se o
Estado não fará justiça, farei eu. Após um julgamento sumário,
muitas vezes sem evidência qualquer, o dito “cidadão de bem”
forma seu juízo, profere sua sentença, mune-se de porretes, paus e
pedras. Vagando pelas ruas como se fosse um ser puro, iluminado, de
onde apenas a justiça mais perfeita pudesse emergir, desce o cacete
no primeiro “réu” que aparece em sua frente (antes mesmo do
julgamento).
Ingênuo ou
ignorante, alheio de que o chamado “amplo direito de defesa” é
uma conquista que nos afasta da barbárie, o cidadão de bem não
entende que ele pode estar enganado. Ele não entende que o processo
de defesa serve, justamente, para que inocentes não sejam punidos. E
por não entender isso, o “cidadão de bem” se coloca acima da
constituição do Brasil e declara pena de morte àquele cara ali, do
outro lado da rua, que disseram que roubou um chiclete.
Uma dona de
casa, morreu
dois dias após ter sido espancada por dezenas de moradores de
Guarujá, no litoral de São Paulo. Segundo a família, ela foi
agredida a partir de um boato gerado por uma página em uma rede
social que afirmava que a dona de casa sequestrava crianças para
utilizá-las em rituais de magia negra. Na verdade, a confundiram com
outra mulher.
No Espírito
Santo, um homem foi cercado por um grupo armado com pedras, barras de
ferro e pedaços de madeira. Momentos depois, ele
foi alvo de um espancamento coletivo e morto. Foi acusado de
tentar estuprar uma garota. Sendo um doente mental, o irmão garante
que ele seria incapaz disso. Um morador, confessa: “Ninguém
viu esse tal estupro ou mesmo noticias da suposta vítima”.
E assim, o
brasileiro sedento por sangue, prisões, pena de morte, sem perceber,
vai transformando seu país exatamente naquilo que ele não deseja.
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