Nigel Amon - Cubisme Africain

Nigel Amon   -   Cubisme Africain

4 de ago. de 2020

Após denúncia da Repórter Brasil e Agência Pública, Comitê de Ética da universidade suspendeu pesquisa financiada por produtores de soja que visava reverter a proibição do paraquate


Unicamp suspende pesquisa que poderia liberar agrotóxico letal





Após revelações em matéria da Repórter Brasil e da Agência Pública, o comitê de Ética da Unicamp suspendeu pesquisa conduzida em laboratório da Faculdade de Ciências Farmacêuticas que estava sendo usada para liberar o uso de agrotóxico letal. A reportagem denunciou que, antes mesmo de ser concluída, a pesquisa era peça central do lobby para reverter a proibição do paraquate, classificado como “extremamente tóxico” e um dos agrotóxicos mais usados no Brasil. O produto está com data marcada para ser banido em setembro deste ano, segundo decisão tomada pela Anvisa em 2017 com base em evidências de que ele pode gerar mutações genéticas e a doença de Parkinson nos trabalhadores rurais.

A poucos meses da proibição, porém, o lobby pressionava a Anvisa pela reversão do veto usando como argumento um controverso estudo financiado pela Associação Brasileira de Produtores de Soja (Aprosoja) – que representa o setor que mais usa o paraquate. A pesquisa determinaria se o produto pode ser encontrado na urina dos trabalhadores que o aplicam dentro de tratores de cabine fechada no Mato Grosso. Entre as muitas falhas apontadas na metodologia, ela não incluiu outras pessoas que também são expostas ao produto, como os trabalhadores que fazem o transporte e o tratamento dos grãos, as comunidades do entorno e os trabalhadores de fazendas onde não há tratores com cabine fechada.

Revelando seu entusiasmo pela segurança do uso do agrotóxico, as declarações dadas pelo médico e professor aposentado da Unicamp Ângelo Trapé para a reportagem geraram questionamentos entre pesquisadores da instituição. “O contato do trabalhador que faz a pulverização é nulo. É tudo mecanizado, trator fechado, vedado”, afirmou Trapé, que questionou a proibição do produto antes mesmo de concluir a sua pesquisa.

Dois dias após a publicação da reportagem, o departamento de Saúde Coletiva da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp, onde Trapé foi professor, publicou uma nota de repúdio afirmando que já foi “bem estabelecida a associação do agrotóxico com diversas doenças relacionadas ao trabalho como fibrose pulmonar, insuficiência renal, Doença de Parkinson e danos genéticos”. A nota manifesta ainda “indignação” pelo uso da pesquisa para reverter a proibição do paraquate e afirma que a citação de Trapé como professor aposentado da universidade caracteriza “abuso do uso de imagem da Unicamp, em busca de algum grau de legitimidade para estudos que claramente colidem com os interesses da saúde coletiva”.

A nota foi posteriormente endossada pela Faculdade de Ciências Farmacêuticas, onde fica o laboratório em que a pesquisa estava sendo conduzida. O texto reforça a preocupação da instituição com o fato de que o “paraquate, comprovadamente, causa graves intoxicações ocupacionais e acidentais aos trabalhadores rurais”.

Por fim, o Comitê de Ética da universidade colocou o assunto em pauta e decidiu, nesta quarta dia 29, pela “suspensão da autorização da pesquisa em questão “por haver indícios de omissão de informações por parte dos envolvidos”. O órgão não detalhou quais são essas informações (leia nota completa).



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